As Duas Teresas e as Flores.
Santa Teresa de Ávila e Santa Teresinha do Menino Jesus, as duas santas carmelitas Doutoras da Igreja, mãe e filha, têm muita coisa em comum. Evidentemente, a pequena Teresa muito aprendeu de sua Fundadora e Mestra Espiritual. Entre tantas intuições e metas na vivência do Absoluto de Deus que as unem, há uma toda especial: o amor às flores. Esta faceta já é bem conhecida em Santa Teresinha, que desde cedo recebeu o carinhoso título de "Santa das Rosas". Quanto a Santa Teresa de Ávila, cujo nome está mais associado aos escritos de alta envergadura mística, é de certa forma novidade saber que as flores, também nesta, exerceram grande influência. Vejamos em que sentido as duas Teresas, a Grande e a Pequena, foram capazes de vislumbrar nas cores e odores da natureza os sinais da presença de Deus.
Teresinha tem as flores de sua preferência, sobre as quais se referiu de modo especial: a rosa, o lírio, a bonina, a violeta, o miosótis, a papoula, as centáureas e a nigela dos trigos. Celina, sua querida irmã e companheira na famosa peregrinação feita à Itália, conta-nos algo muito pitoresco: "Muitas vezes também nas esquinas ou às portas das igrejas, encontrávamos grupos de garotas vestidas à moda italiana. Elas tinham instrumentos de música e cestos cheios de flores. Era preciso vê-las correndo atrás de Teresa! Era para quem elas davam as flores e gritavam: Bella Signorina! Bella Signorina". Neste episódio observamos que, desde menina, não era Teresinha que corria em busca das flores. As próprias flores sentiam uma irresistível atração pela pequena flor do Carmelo, perseguindo-a em sua pureza e beleza.
Para Teresinha a flor simboliza a beleza e a grandeza de Deus. Cada florzinha, a mais humilde, traz-lhe uma lição de vida espiritual. E ela, que quis aprender no "livro da natureza", prestará atenção a cada botão de rosa que desabrocha esfuziante e a cada miosótis em seu escondimento e humildade, colhendo em ambos a alegria de louvar o Pai que a tudo gera com o mesmo amor.
A própria Teresinha se considera uma florzinha querida de Jesus. O título de sua autobiografia é exatamente "História Primaveril de uma Florzinha branca". Ela será sempre aquela florzinha branca que seu pai lhe deu no dia em que lhe confidenciou sua vocação. Sendo uma florzinha, crescerá cercada de flores abundantes, que a marcarão profundamente. Escrevendo ao Pe. Bellière, aos 25 de abril de 1897, e referindo-se às suas irmãs de sangue, ela dizia: "Jesus, na sua misericórdia, quis que, entre essas flores, crescesse uma das menores. Jamais poderei agradecer-lhe bastante por isso, pois, foi graças a essa condescendência que eu, pobre florzinha sem brilho, encontro-me no mesmo canteiro que as rosas, minhas irmãs". A contemplação das flores não será um mero deleite espiritual na vida de Santa Teresinha. Usará delas para dar uma explicação da difícil questão da concessão da graça divina de maneira diversificada ou em graus variados aos homens. Vejamos a comparação que ela cria, através de uma fina intuição teológica, admirável numa jovem religiosa cujos conhecimentos teológicos nada tinham de acadêmico:
"Jesus aceitou instruir-me a respeito desse mistério, pôs diante dos meus olhos o livro da natureza, e compreendi que todas as flores que Ele criou são belas, que o brilho da rosa e a alvura do lírio não impedem o perfume da pequena violeta ou a simplicidade encantadora da margarida... Compreendi que se todas as florzinhas quisessem ser rosas a natureza perderia seu adorno primaveril, os campos não seriam mais salpicados de florzinhas... Assim é no mundo das almas, o jardim de Jesus. Ele quis criar os grandes santos que podem ser comparados aos lírios e às rosas e criou também santos menores, e estes devem contentar-se em ser margaridas ou violetas destinadas a alegrar os olhares de Deus quando os baixa aos pés, a perfeição consiste em fazer sua vontade, em ser aquilo que Ele quer que sejamos... Compreendi também que o amor de Nosso Senhor revela-se tanto na alma mais simplesm que em nada resiste à sua graça, como na alma mais sublime. Na realidade, é próprio do amor rebaixar-se. (...) Assim como o sol ilumina ao mesmo tempo os cedros e cada florzinha, como se ela fosse única sobre a terra, assim Nosso Senhor se ocupa particularmente de cada alma como se não houvesse outra igual".
Teresinha, em seus escritos, sempre retoma o tema das flores. Estas criaturinhas de Deus estão presentes de forma tão contundente na vida da Santa das Rosas, que Madre Maria dos Anjos chegou a fazer a seguinte observação: "Na piedade da Serva de Deus há uma coisa que me chama a atenção, tanto mais que jamais a vira em nosso Carmelo, e da qual jamais ouvi falar na vida dos santos: é o papel que ela dá às flores. Todas tinham para ela uma linguagem especial, revelando-lhe o amor infinito de Deus e suas perfeições. Ela se servia delas também para dizer a Deus seu próprio amor e os sentimentos de seu coração. À noite, no verão, na hora do silêncio, e muitas vezes nos dias de festa, durante as recreações, ela jogava flores ao Calvário de nosso pátio".
A história de Santa Teresinha com as rosas é longa! Precisamos ir à infância de nossa santinha para entender este amor entranhado que unia Teresinha às flores, especialmente às rosas. No dia 11 de março de 1873, não sabendo mais o que fazer para curar sua pequena Thérèse de uma gastrenterite, Zélie Martin resolveu ir a Sémaillé, um vilarejo próximo a Alençon, à procura de uma senhora chamada Rose Taillé para ser a ama-de-leite de sua caçula. Assim, de 16 de março de 1873 a 2 de abril de 1874, Teresa viveu nesse lugar, cujos habitantes tinham um gracioso costume: presentearem-se, por qualquer motivo, com flores. A precoce convivência com essa variedade de perfumes certamente terá despertado em nossa Santa uma paixão que a dominará até o fim de seus dias: as flores, especialmente as rosas.
Uma referência importante ao seu amor indistinto pelas rosas, pode ser encontrada numa carta dirigida à prima Maria Guérin no dia 18 de agosto de 1887: "Amo tanto uma bela rosa branca, quanto uma rosa vermelha". É também conhecido o enorme prazer com que lançava pétalas de rosas para o alto quando via passar o ostensório com o Santíssimo Sacramento. Madre Inês, sua irmã de sangue, relata que, no dia 14 de setembro de 1897, poucos dias antes de seu falecimento, Teresinha ganhou uma rosa e a desfolhou sobre o crucifixo de forma muito carinhosa. Algumas pétalas caíram ao chão da enfermaria. Muito seriamente, a santa teria afirmado: "Ajuntai bem estas pétalas, minhas irmãzinhas, elas vos servirão a dar alegrias, mais tarde... Não percam nenhuma..."
Ela também gostava de cobrir de pétalas o seu crucifixo, de forma muito cuidadosa, retirando pacientemente as pétalas murchas. No entanto, não lançava flores em ninguém. A mesma Madre Inês conta que, certa vez, colocou-lhe rosas nas mãos, pedindo-lhe que as atirasse em alguém, como sinal de afeto. A santa recusou-se a fazê-lo, considerando que só lançava rosas para seu amado Jesus.
Quem tanto amava as rosas, vai prometer, quase ao fim da vida, que fará chover rosas sobre o mundo. Com esta promessa estava se prontificando a interceder pela humanidade junto a Deus. As conhecidas afirmações “Passarei o meu céu fazendo o bem sobre a terra” e “Depois de minha morte mandarei uma chuva de rosas” foram evocadas pela Irmã Maria do Sagrado Coração em seu depoimento no Processo de Beatificação da padroeira dos missionários. Após sua morte os milagres irão se multiplicar. Quem prometeu continuar sua missão no céu, trabalhando para o bem das almas, nunca frustrou os que confiam em sua oração. Ainda hoje são muitos os relatos de curas, milagres e conversões realizados por intermédio da humilde carmelita. Santa Teresa de Ávila, Mãe e Fundadora da Ordem na qual Teresinha se consagrou a Deus, e de quem recebeu o nome na pia batismal, era apaixonada pela água. A grande Teresa se serviu muitíssimas vezes deste elemento da natureza para nos transmitir sua doutrina espiritual. Se as flores são o sorriso de Deus exibido através de sua obra mais maravilhosa, a Natureza, é certo que Santa Teresa de Ávila relacionou-se muito intimamente com as flores. Estas não deixaram de influir em seu modo de ser e em suas atitudes e comportamentos ao longo da vida. Teresa de Jesus também delas se serviu para ilustrar seus ensinamentos, sobretudo ao discorrer sobre as virtudes.
Possuímos não poucos testemunhos de seu amor às flores. No "Livro da Vida", ela mesma nos diz que gostava e era muito proveitoso para seu espírito "ver campos, águas, flores; encontrava nessas coisas a lembrança do Criador, isto é, elas me despertavam e me recolhiam, servindo-me de livros".
Podemos imaginar a menina Teresa Ahumada brincando nos trigais de Gotarrendura e também podemos vê-la extasiada, deleitando-se a contemplar os campos de amapolas, saltitando sobre as margaridas silvestres de beleza indescritível. Outras flores com as quais ela teve contato em sua infância, nos campos de Gotarrendura ou em seu jardim de Ávila, foram sem dúvida, os girassóis e os lírios. Há quem afirma que o girassol, tanto a planta como a flor, orienta o espírito de quem o contempla à solução feliz de todos os seus problemas. O lírio, de sua parte, também muito chamou a atenção da Fundadora do Carmelo Descalço. Irmã Maria de São José, uma das companheiras da viagem que a santa empreendeu de Caravaca a sevilha, conta deliciosamente em seu Livro das Recreações: elas pararam para descansar numa formosa floresta e aí a Santa Madre começou a se desmanchar em louvores a Deus diante da diversidade das flores e o canto de mil passarinhos. Foram quase obrigados a arrastá-la daquele lugar tão florido e tão repleto de trinados.
O nardo, os lírios, e de modo particular as rosas, foram objeto do amor de Santa Teresa de Jesus. Sem dúvida a rosa foi a flor que mais influenciou a Santa Madre. Isto é fácil de compreender pois sabemos como esta flor, com tantas variedades, cada qual mais formosa, inspirou tantos poetas, músicos, pintores. Não seria Teresa de Jesus a se esquecer delas!
Exemplo único e flor formosíssima não só no céu, mas também entre nós, o foi Santa Teresa. Quem sabe por isto, o Senhor, que é a flor mais bonita do campo da Igreja e da humanidade, fez com florescesse uma amendoeira em Alba de Tormes, quando Teresa estava prestes a morrer. Segundo testemunhas, tratava-se de uma arvorezinha seca, que nunca dera frutos, localizada próxima à cela da Santa Madre. De repente cobriu-se de flores. Era cinco de outubro, não era tempo de primavera, que, neste caso, milagrosamente antecipou-se. Esta foi uma homenagem do Senhor à mais formosa flor de Ávila, cujo pólen prossegue nutrindo, ainda hoje, como alimento espiritual, todos aqueles que desejam aproximar-se de Deus no caminho da perfeição. Teresa já havia dito que escrevia para gulosar as pessoas com a grande bondade de Deus.
Assim foi Teresa, tão amiga de seus amigos e tão amiga de Cristo, sempre cultivando rosas brancas para todos. Duas Teresas, a de Lisieux e a de Ávila, duas flores do jardim carmelitano, a perfumarem nossas vidas com os odores do amor de Cristo!
Fontes: "Dicionário de Santa Teresinha", Pedro Teixeira de Cavalcante, Ed. Paulus; Revista "Teresa de Jesus", mayo-junio 1999, "La influencia de las flores en Teresa de Jesús", Félix Sánchez, pp. 127-128.
Nenhum comentário:
Postar um comentário